No próximo dia 15 de outubro, sábado, pelas 21h30, o Cine-Teatro Louletano acolhe a peça de teatro «O Homúnculo», com texto original da escritora Natália Correia, levado à cena pelo Teatro Estúdio Fontenova. Na sinopse da peça pode ler-se: “Era uma vez um país tão perto no espaço e no tempo que nos basta nada fazer para lá irmos parar. Esse país não vem no mapa, a sua geografia habita nas memórias e cicatrizes de um povo artesão especialista em fundir o mito com a realidade. Nesse país há um homem que impõe a sua vontade e governa acima de todos os outros, será que um só homem consegue manter o poder sobre 10 milhões de almas?”.
«O Homúnculo» é um texto de Natália Correia, apreendido pela PIDE logo após ser publicado, em 1965, e que nunca até hoje fora representado em teatro profissional (só há notícia de uma experiência, quase clandestina, pelo Cénico de Direito, no início dos anos setenta, dirigida por José Manuel Osório). Em 2015 cumpriram-se 50 anos desde a sua primeira e única publicação em livro, e só nos pode surpreender e fazer meditar o facto de a cena teatral do Portugal democrático ter ignorado até hoje a potencialidade teatral que habita na crítica inquietação desta criação nataliana. No dizer de Armando Nascimento Rosa, “«O Homúnculo (tragédia jocosa)» é uma das raras obras mestras que no teatro português consegue operar o cruzamento entre a estética surrealista, o teatro do absurdo e a sátira política”.
A coragem cívica da voz poética de Natália, aliada a um singular talento como dramaturga, encontra-se bem patente numa peça em que Mortocália é a metáfora grotesca de um país onde reina Salarim, uma espécie de novo rei Ubu e seus acólitos, representantes dos poderes eclesial (o Bispo), militar (o General), académico e corporativo (o Bobo Mnemésicus). Poderosa sátira inspirada na figura de Salazar, o texto de Natália não se circunscreve porém somente ao contexto epocal, mental e sociopolítico que o motivou, demonstrando a sua intemporalidade na linguagem inventiva e ágil com que convoca o fazer teatral, bem como, em termos de mundividência, na denúncia inteligente do despotismo repressor do pensamento livre e plural, por intermédio de um universo dramatúrgico extremamente aliciante para a criação cénica contemporânea.
Provocatório e experimental, «O Homúnculo» concretiza-se num espetáculo que pretende testar na cena a capacidade de sermos interpelados pela obra dramática de uma autora crucial da cultura portuguesa novecentista, que nos convida à reflexão partilhada sobre o abuso dos poderes do Estado em face do exercício da cidadania ativa de cada indivíduo, num exercício de imaginação alegórica, emancipatório e surrealizante. O espetáculo tem a duração de 60 minutos, dirige-se a maiores de 12 anos e tem um custo associado por pessoa de 9 euros, sendo que para maiores de 65 e menores de 30 anos o valor passa para 7 euros. O Cartão de Amigo do Cine-Teatro é aplicável a este evento.