Depois de ocupar, durante alguns anos, uma
posição secundária, a Cultura parece estar outra vez na moda, melhor dizendo,
no rol das prioridades dos atuais governantes, como atesta o ressurgimento do
Ministério da Cultura e a criação de diversos programas de valorização
cultural. Realizar-se muitos eventos não é o mesmo, porém, que existir uma
efetiva Política Cultural, nem tão pouco que se faça uma boa Gestão Cultural,
ou até mesmo uma adequada Programação Cultural. E foi para ficarmos mais
esclarecidos sobre tão complexo tema que estivemos à conversa com Jorge
Queiroz, presidente da Associação de Gestores Culturais do Algarve.
Texto: Daniel Pina |
Fotografia: Daniel Pina
É no Museu Municipal de Tavira que encontramos Jorge
Queiroz, chefe da Divisão da Cultura, Património e Museus da Câmara Municipal
de Tavira e presidente da direção da AGECAL – Associação de Gestores Culturais do
Algarve, entidade que nasceu, em 2008, fruto da consciência de muitos
profissionais desta área de que a Cultura tem uma palavra importante a dizer no
desenvolvimento das cidades, regiões e nações. E isto porque, se é facilmente
aceitável que a cultura tem um efeito positivo na economia, não tão fácil é
pensar-se numa economia da cultura. “Não se estuda devidamente o impacto dos
investimentos e atividades culturais na economia de cada terra. Normalmente há
sempre uma noção exata da despesa que se teve com determinado acontecimento ou
programa, mas não há a medição do retorno, o que gera um diálogo desequilibrado
entre a economia e a cultura”, entende Jorge Queiroz.
Certo é que muitas cidades europeias são inundadas por
turistas de índole cultural, casos de Roma, Atenas, Paris, Londres, pessoas de
múltiplas nacionalidades que ali vão visitar os monumentos e assistir a
espetáculos de várias formas artísticas. Aliás, mesmo em Portugal, diversos
monumentos recebem milhares de visitantes ao longo do ano, o que constitui uma
receita significativa para os cofres nacionais. “O facto de existir uma vida
cultural leva a que as pessoas estejam mais tempo nas cidades e, mercê disso,
gastem mais dinheiro”, aponta o entrevistado, lembrando que a Gestão Cultural
surgiu na segunda metade do século XX em consequência da evolução das
sociedades, focalizando-se na administração dos recursos naturais de uma
determinada área geográfica, cidade, município ou região, de instituições
públicas ou privadas. “Quando a Europa se começou a reconstruir a partir das
cinzas da Segunda Guerra Mundial, houve um investimento forte na criação de um
Estado Social e a Cultura é um elemento fundamental para o desenvolvimento
humano e das comunidades. Foram construídos equipamentos, alguns à custa de milhões
de euros, e geri-los exige conhecimentos específicos”, explica.
A Gestão Cultural é, assim, uma disciplina autónoma que
exige, como todas as outras, formação científica superior e
técnico-profissional, experiências em contexto de trabalho, análise e evolução.
“Política Cultural são os princípios, Gestão Cultural é a gestão dos recursos
culturais, que podem ser um monumento, uma biblioteca, um teatro, um museu, um
sítio arqueológico, um centro de ciência. São necessários conhecimentos
técnicos de gestão de equipas, gestão da comunicação, gestão financeira, gestão
dos próprios conteúdos e dos programas. A Programação Cultural é uma área
dentro da Gestão Cultural, assim como a Produção Cultural”, esclarece Jorge
Queiroz. “Qualquer área do conhecimento tem profissionais, portanto, os
equipamentos culturais devem ser geridos por aqueles com formação específica”.
Formação específica que existe na vizinha Espanha, com
licenciaturas em Gestão Cultural, por se perceber que não basta, por exemplo,
uma pessoa ter um curso de Arqueologia para gerir as várias facetas e
complexidades de um sítio arqueológico. “É um enfoque diferente. Não é só
conservar um monumento, mas também organizar equipas, fazer comunicação
externa, atrair e receber públicos, dinamizar um serviço educativo. Isso tudo é
Gestão Cultural”, distingue Jorge Queiroz, enfatizando a importância desse
profissional ter conhecimentos de Direito da Cultura, Economia da Cultura,
Gestão de Recursos Humanos em equipas de intervenção cultural, Comunicação da Cultura,
Turismo Cultural, entre outros.
Mais complexa se torna a matéria quando envolve o público e
privado em simultâneo, com os conteúdos a serem normalmente do foro privado e
os equipamentos do foro público. “Numa biblioteca pública, os livros são disponibilizados
gratuitamente aos utentes, mas esses livros foram feitos por alguém, pelas
editoras, que são privadas. Ou seja, a biblioteca presta um serviço público de
desenvolvimento cultural da comunidade, mas os livros não caem do céu”,
exemplifica o diretor do Museu Municipal de Tavira. “A Gestão Cultural também
não produz a componente artística, essa é da competência dos criadores, dos
bailarinos, atores, músicos, artistas plásticos”.