Foi lançado, no dia 10 de maio, o novo romance de
Carlos Campaniço, de seu nome «As Viúvas de Dom Rufia», um digno sucessor de
«Mal Nascer», livro finalista do Prémio Leya, em 2013. Nesta obra, o escritor
regressa ao Alentejo onde nasceu e cresceu, mas numa geografia alternativa,
para nos contar mais uma história repleta de personagens fascinantes e
peripécias inesquecíveis. Um livro que assinala o fim de um ciclo, seguindo-se
a edição de uma obra para crianças, antes de embarcar para outras aventuras,
numa nova época histórica, mas isso fica para contar mais tarde…
Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina
Alentejano de nascença, Carlos Campaniço veio para o Algarve
há sensivelmente duas décadas para tirar uma licenciatura em Línguas e
Literaturas Modernas, variante de Estudos Portugueses, e um Mestrado em Cultura
Árabe, Islâmica e o Mediterrâneo, e de Faro nunca mais saiu. Antes disso, aos
16 anos, já escrevia poesia e compunha letras para uma banda de punk/rock da
qual era vocalista, os «Réus da Sociedade», um projeto algo inusitado no meio
rural onde vivia, no distrito de Beja. “Era música de intervenção e
contestação, com alguma ironia também”, recorda, com um sorriso, acrescentando
que lia bastante poesia, “o mais sublime dos géneros literários”, durante a sua
adolescência.
Da leitura à escrita costuma ser, nestes casos de paixão
espontânea, um pequeno passo, mas textos para ficar na gaveta, ou mostrar aos
amigos mais chegados, coisas incipientes, reconhece, quando olha para esse
passado distante. “Primeiro, há a grande paixão, lemos e consumimos. Depois,
alguns dão o passo seguinte, tentam escrever, não se contêm apenas com a
leitura, e foi isso que sucedeu comigo. Enveredei por um curso de línguas e
literaturas, mas achava sempre que nunca estava preparado para publicar, para
escrever um livro a sério”, conta, daí que, só a chegar aos 30 anos, tenha
lançado o primeiro romance, «Molinos», que abordava a penosa vida rural do
Alentejo da década de 40. “Era uma sociedade estratificada, ainda de classes,
onde a terra pertencia a muito poucos e o resto das pessoas trabalhava de
sol-a-sol”, lembra o entrevistado.
A ligação ao Alentejo onde viveu a primeira parte da sua
vida manteve-se ao longo das obras seguintes, um ciclo que concluiu, agora, com
«As Viúvas de Dom Rufia» e que incluiu ainda «Os Demónios de Álvaro Cobra» e
«Mal Nascer». “São romances de época que retratam a vida de uma sociedade, em
determinado período, concretamente as comunidades rurais do Alentejo, as suas
condições difíceis de vida, a sua condição agrária, a sua imaginação enquanto
povo coletivo. Inventei uma espécie de geografia alternativa, já que, em cada
romance, vão nascendo novos povos e aldeias, que depois interagem entre si”,
descreve Carlos Campaniço.
Pelo meio, o Diretor de Programação do Auditório Municipal
de Olhão escreveu ainda um ensaio histórico sobre o Algarve, de nome «Da Serra
de Tavira ao Rif Marroquino - Analogias e Mitos» e o livro «A Ilha das
Duas Primaveras», que se passa algures no Mediterrâneo. Sobre o cenário escolhido
para os romances, explica ter sido uma escolha afetiva e consciente. “Teria
mais dificuldade em escrever um romance sobre os pescadores de Olhão e as suas
fainas, por exemplo, porque não conheço os ciclos, o nome dos artefactos, mil e
uma coisas. É mais fácil escrever sobre um imaginário coletivo no qual cresci a
ouvir histórias e historietas, mas um autor não se restringe a isso, pelo que
este ciclo termina agora. Foram nove anos que deram origem a quatro romances,
que não são sequenciais. «Os Demónios de Álvaro Cobra» tem muito de fantástico,
explora bastante o imaginário dos povos rurais, os medos e fantasias, o bruxo e
o santo. O «Mal Nascer» é um livro muito cru que conta a história de sofrimento
de uma mãe que fica viúva, e de um filho que fica órfão, depois o padrasto é
uma besta, apanha também um período das Guerras Liberais. Já o «As Viúvas de
Dom Rufia» é repleto de ironia”, descreve.